Setembro é conhecido por ser o mês onde há a conscientização de várias lutas e causas no chamado Setembro Amarelo. Dia 10 é celebrado o Dia Mundial da Prevenção ao Suicídio a fim de informar a população sobre os riscos e problemas relacionados a transtornos mentais que podem ocasionar o suicídio. Um desses transtornos é a depressão, que acarreta uma série de problemas para o indivíduo no seu convívio social e autoestima.
Devido ao isolamento social e às demandas físicas e mentais do momento, muitas pessoas estão se sentindo mais introspectivas, enfrentando desafios e questões relacionadas à saúde mental, às sensações e também aos seus sentimentos. Isso traz à tona a importância do autocuidado e autoconhecimento para que estas situações sejam enfrentadas da melhor maneira.
A depressão causa muito desconforto e angústia, além de alterar a vida e comportamento da pessoa que desenvolve esse transtorno. Drª Linda Vieira*, psicóloga do Clude, explica o que é esse transtorno, quais são os fatores que podem desencadear tal sentimento e como a depressão pode influenciar diretamente na autoestima e na vida da pessoa.
Qual a diferença entre tristeza e depressão?
A tristeza é um sentimento ocasionado por situações específicas, sendo algo momentâneo, com uma duração mais curta. Drª Linda afirma que “podemos considerar a tristeza como uma sensação causada por uma situação momentânea, por algo que decepcionou ou por algo que é situacional”. Portanto, ela é desencadeada a partir de uma notícia ruim, um luto pela perda de alguém e até mesmo por conta do desemprego.
Já a depressão é um transtorno, um estado permanente que abrange diversos sentimentos, como angústia, ansiedade, baixo estima, pessimismo e desesperança, e não é algo momentâneo. Devido a isso, a pessoa tem maior dificuldade de sair dessa situação, apresentando vários tipos de desinteresses, problemas para realizar tarefas do cotidiano, além de complicações para dormir e se alimentar.
O sentimento de tristeza pode ter algum tipo de relação com a depressão, mas a diferença é que na depressão há muitos fatores envolvidos. “A pessoa tem muita dificuldade de enfrentamento e de se posicionar. Não possui objetivos claros e muitas vezes é pressionada pela família, desencadeando cada vez mais esse sentimento”, explica Drª Linda.
Como identificar a depressão?
De acordo com a Drª Linda, a depressão possui características específicas, inclusive fisiológicas, pois o corpo começa a manifestar sintomas, como cansaço extremo, melancolia, fadiga e apatia. Devido a isso, o indivíduo possui também alterações no apetite, desmotivação constante e choro.
Outro sintoma comum da depressão é o sono alterado, onde “a pessoa começa a dormir muito. O ato de dormir é uma forma que ela encontra de não entrar em contato com o que está acontecendo. É uma fuga”, salienta Drª Linda.
Portanto, a depressão pode ser identificada através de alguns sintomas, e caso você, um amigo ou um familiar observe essas mudanças de comportamento, é necessário buscar tratamento e ajuda psicológica.
Qual a diferença entre depressão bipolar e unipolar?
A depressão tem diversos estágios e várias vertentes. Uma delas, é a depressão bipolar, onde o indivíduo tem momentos de euforia e manias que podem variam entre picos de alegria e tristeza. Com isso, a pessoa desenvolve algumas dependências, como compulsão por compras, comida e sexo, por exemplo.
Segundo a Drª Linda, é difícil de fazer o diagnóstico da depressão bipolar porque isso também pode ser uma característica própria da pessoa, sendo que em determinadas situações ela pode estar super motivada, e de repente, ela acaba se desmotivando sem razão aparente.
No caso da depressão unipolar, é o estado onde a pessoa possui uma tristeza profunda, mas não possui vícios ou manias. Porém se mantêm em um nível de melancolia constante, sem picos de euforia.
Para identificar e diagnosticar esses dois tipos de depressão é necessário realizar estudos mais profundos para entender o estilo de vida que a pessoa leva e o que acarretou esses sentimentos.
Como lidar com o diagnóstico da depressão?
A depressão é diagnosticada por um profissional da área e identificada através dos comportamentos, ações e relatos do paciente. Porém, alguns fatores podem prejudicar também no tratamento do transtorno e isso pode começar até mesmo no diagnóstico.
“Muitas pessoas acabam tendo alguns ganhos quando são diagnosticadas. Acabam fugindo das suas responsabilidades e acabam chamando mais atenção. Precisamos ver quais tipos de ganho que essa pessoa terá em permanecer em uma determinada situação”, explica Drª Linda.
Assim como em qualquer outro diagnóstico, é necessário ter cautela, estar ciente de que é uma situação delicada e que necessita de esforços para obter resultados e enxergar melhorias. Drª Linda comenta que “muitas pessoas dizem que querem mudar porque desejam voltar a ser como era antes, mas voltar ao que se era, às vezes é o que te trouxe a ter um quadro ruim. Então você terá que mudar tudo!”.
A forma que você vive e conduz sua vida terá que passar por transformações, e o mais importante é que o paciente não se limite ao diagnóstico que receber, pois ele mesmo precisará promover a sua mudança e isso vai muito além.
Isso faz com que muitos profissionais da área evitem falar os diagnósticos, inclusive de depressão. “Você é muito mais que um diagnóstico! Não vejo um diagnóstico, eu vejo uma pessoa que chegou em um diagnóstico por limitações, por dificuldades e crenças. Tem uma história por trás dessa pessoa e é ela que está em sofrimento. O diagnóstico é uma nomenclatura”, Drª Linda.
Qual o trabalho do psiquiatra no tratamento da depressão?
“É muito comum que as pessoas busquem primeiro o tratamento com um psiquiatra, mas é importante que se busque a psicoterapia de início, pois é ela vai entender como tudo começou e o que desencadeou a depressão”, explica Drª Linda.
Drª Linda explica que se o paciente chegar na terapia com um quadro grave de depressão é necessário que o mesmo seja acompanhado também por um psiquiatra que fará uma avaliação completa, o auxiliando através de medicações específicas para o seu caso.
Portanto, é aconselhável fazer o trabalho conjunto entre as sessões com o psicólogo e psiquiatra, caso seja necessário. Assim, o paciente não ficará apenas com a medicação, mas também terá um acompanhamento com a terapia para identificar os motivos que o levou a esse estado.
Como o estilo de vida pode desencadear a depressão?
Devido ao trabalho, faculdade, filhos e outras tarefas do dia a dia é comum que não haja tempo para cuidar da saúde mental. Coisas simples, como zelar pela autoestima, concentrar-se para ler um livro ou praticar exercícios físicos é algo que às vezes é deixado em segundo plano.
“A alimentação, o estilo de vida, uma pessoa que não se prioriza, pessoas que abrem mão dos prazeres para cumprir apenas obrigações, com o tempo ela vai se desmotivando, se questionando do porquê ela faz tudo isso. Portanto, na nossa vida o ideal seria que a gente pudesse conciliar tudo”, Drª Linda.
Drª Linda afirma que é necessário “buscar esse equilíbrio entre conciliar o trabalho, as obrigações e o lazer. A pessoa tem que se ajustar para ter uma organização, para ter tempo de cuidar de si, tempo de ter uma boa alimentação, cuidar saúde como um todo e também ter tempo para estar com a família”.
Devido a um projeto no trabalho, por exemplo, a pessoa acaba se dedicando integralmente nisso e se afasta de amigos e parentes. “Muitas vezes o trabalho demanda uma atenção maior, mas isso deve ser apenas por um curto período”, enfatiza Drª Linda. Porém, quando isso se torna algo frequente, a pessoa desencadeia uma sobrecarga mental, que pode levar a exaustão, depressão e até mesmo a síndrome de Burnout.
“As pessoas trabalham 24 horas e gostam do trabalho, não percebem que isso está causando uma exaustão. O corpo dá sinais de que alguma coisa não está bem, e você começa a ter um cansaço maior, a não dormir bem e estar sempre desmotivado. Isso pode levar a um quadro de depressão, onde a pessoa não encontra prazer no que está realizando”, Drª Linda.
A autoestima pode influenciar na depressão?
“Uma pessoa com baixa autoestima é aquela pessoa que não se reconhece merecedora, não gosta de si, do corpo, da aparência. Isso pode levar a um quadro de afastamento, onde a pessoa não se posiciona. Então, a pessoa recusa convites, não se relaciona porque ela tem inseguranças contra sua aparência, e isso pode sim levar a um quadro de tristeza e depressão”, argumenta Drª Linda.
É importante trabalhar os pilares da autoestima: o autoconhecimento, auto aceitação, auto responsabilidade e amor próprio. Com isso a pessoa consegue identificar suas competências, a se aceitar e principalmente a ter amor próprio, pois “é fundamental que a gente consiga gostar do que somos e de como somos […]”, reforça Drª Linda.
A pessoa precisa determinar suas vontades, como ela poderá mudar algo em si mesmo e como desenvolver suas próprias habilidades. Geralmente, pessoas com baixa autoestima enxergam apenas o que elas consideram ruins em si mesmos, não se valorizam e por conta disso, podem desencadear a depressão. Sendo assim, é necessário elevar e fortalecer sempre suas potencialidades.
“A aceitação é um dos pilares da autoestima. Muitas pessoas não se responsabilizam por nada e acham que o outro é culpado. Por mais que isso aconteça, nós sempre seremos responsáveis. Nós podemos ficar ou sair dessa situação, mas tem muita gente que se confunde e acha que está em uma situação por causa de determinada pessoa e isso acaba gerando uma angústia que também pode levar a um quadro depressivo”, explica Drª Linda.
O autocuidado e autoconhecimento é fundamental para manter em equilíbrio a saúde mental e autoestima, pois a pessoa que se conhece, se prioriza e sabe suas potencialidades conseguirá lidar com mais facilidade em situações que demandem esforços e posicionamentos.
Como lidar com as cobranças diárias? É possível aliviar os sintomas de estresse, ansiedade e depressão?
Diariamente surgem cobranças por diferentes motivos e, consequentemente, algumas acabam sendo internalizadas. “Para que esse excesso de cobrança diminua precisamos nos colocar um limite”, diz Drª Linda. Por isso, é preciso “reconhecer quais são as suas necessidades, do que você gosta e do que não gosta, porque muitas vezes não gostamos de fazer muitas coisas mas isso acaba sendo importante para que alcancemos nossos objetivos, nossos propósitos”, salienta.
É necessário trabalhar o que você deseja e o que você precisa fazer para conseguir encontrar e alcançar seus propósitos, pois “a maioria das pessoas desistem dos seus objetivos porque não os tem claro e isso causa frustração e desistências. Precisamos ter uma visão positiva das situações desafiadoras, pois focamos demais no problema e esquecemos da solução”, finaliza Drª Linda.
Devido a isso, é comum desencadear outros sintomas como ansiedade, angústia, tristeza, e que poderá levar posteriormente à depressão. Drª Linda enfatiza que “um dos motivos que levam as pessoas a terem ansiedade é porque elas focam em um problema e acham que ele não tem solução, mas tem! Para tudo tem!”.
Ter o autorrespeito é indispensável para saber quando reagir em situações difíceis. Além disso, é possível aliviar os sentimentos ruins e transtornos como a depressão através do autocuidado, alimentação saudável, prática de exercícios e outras tarefas que despertam interesse. Ou seja: tenha um tempo para você mesmo!
Como a prática de exercícios pode ajudar na depressão?
O corpo é a base de tudo e ele precisa estar em movimento. Para mantê-lo bem, é preciso suprir algumas necessidades, que vão desde a alimentação até as necessidades fisiológicas. Manter o corpo e mente em equilíbrio é essencial, pois isso ajudará no autoconhecimento e autocuidado.
Sobre coisas externas que não somos capazes de controlar, como o trânsito, opinião das pessoas ou situações que influenciam no nosso humor, mas que não estão diretamente ligadas às nossas ações, Drª Linda questiona: “[…] Diante de um problema, o que você pode fazer? Traçar as possibilidades e começar a ver alternativas e soluções!”.
Diversas pessoas não gostam de exercícios físicos realizados em academias, por exemplo. Mas há muitas opções que você pode explorar para deixar seu corpo ativo. Procure atividades prazerosas e que você se identifique, como dança, musculação, lutas ou natação.
Porém, para alcançar um equilíbrio entre corpo e mente, o cérebro também precisa de momentos de quietude e organização. Drª Linda indica a prática de yoga e meditação, porque “a yoga trabalha movimento suaves e leves e que precisam de concentração, e na meditação o foco será na respiração, e isso serve para o dia a dia. Se você está fazendo meditação irá precisar de atenção e foco”, finaliza.
Por esse motivo, é preciso trabalhar a atenção plena, ter equilíbrio, foco, e assim, seu cérebro também estará em movimento. “Comece a exercitar seu foco e atenção nas coisas pequenas. Por exemplo, o barulho da chuva, o cheiro do sabonete durante o banho e o gosto dos alimentos durante as refeições”, completa Drª Linda.
Como é o final do tratamento para depressão?
“No tratamento, a terapia possui várias abordagens. Tem a terapia breve, por exemplo, onde se trabalha um determinado assunto, como uma separação. Porém, a terapia em si não tem tempo determinado”, explica Drª Linda.
A duração da terapia é algo muito pessoal e irá depender da história de cada um. Quando a pessoa recorre à terapia por uma questão de autoconhecimento, por exemplo, o paciente chega com uma questão durante a semana e isso é trabalhado para desenvolver soluções para o problema. Drª Linda enfatiza: “quando uma pessoa chega com um processo de depressão na terapia, a gente vai percebendo as mudanças que ela começa a promover na própria vida. Às vezes ela estava em um trabalho que não gostava e quando essa pessoa troca de trabalho, precisa ter forças para confiar em si mesmo e automaticamente ela vai começar a mudar, a se sentir melhor. Então, na terapia você trabalha nisso e fortalece a pessoa”. Muitas pessoas, ao ver melhoras durante o processo, optam por parar a terapia, voltar algumas vezes ao mês ou continuam com o acompanhamento.
Drª Linda completa: “uma coisa é dizer que a pessoa precisa continuar no processo da terapia. Outra coisa é a pessoa querer ir. Ela precisa ter autonomia e determinar o tempo que ela deseja ficar na terapia”.
Tudo irá depender da história de vida dessa pessoa. Um fator que também pode influenciar são os relacionamentos que ela possui, suas vivências e experiências, pois dependendo da situação poderá acarretar traumas e trazer consequências para o seu desenvolvimento pessoal e até profissional. Drª Linda explica que “se for algo abusivo e tóxico, ela procura tratamento para reparar os danos deixados por eles e com a terapia ela consegue se relacionar novamente, começa a se cuidar e a se valorizar mais. Quando a pessoa está disposta a mudar, as melhoras são muito visíveis”.
Com relação às medicações é necessário uma atenção maior. “No processo de desmame da medicação, muitas pessoas param a terapia e a medicação por conta própria, o que não é aconselhável”, diz Drª Linda. “É o profissional que irá reduzir e mesclar a medicação, que por um tempo ela precisou e que agora não precisa mais. É necessário um acompanhamento, pois a ideia é que a pessoa não precise mais de medicação, mas que continue na terapia para ter autonomia da própria vida sem precisar dela”, completa.
É normal que o indivíduo tenha a intenção de começar a terapia breve, por exemplo. Mas, ela começa a analisar outras coisas, descobrindo que ela é muito mais do que apenas uma situação da vida dela. Portanto, quando se começa a perceber essas coisas é como se um novo mundo, novas relações e possibilidades com si mesmo começasse.
É necessário respeitar seu próprio tempo e espaço. Muitas pessoas se antecipam até mesmo no seu próprio diagnóstico, se limitam em determinadas situações e não procuram a ajuda certa. Estar ciente do que está ocasionando esses sentimentos ruins, a baixa estima e a tristeza, pois tudo o que for influenciar negativamente na sua vida, irá prejudicar seu convívio social, sua percepção da vida, o que pode dar gatilho para desenvolver esses transtornos, inclusive a depressão.
Atente-se em você, esteja em conexão com as suas vontades, com os seus objetivos e seus propósitos, e assim, mantenha o equilíbrio certo na sua vida. É completamente normal ter sentimentos, sendo eles bons ou ruins, mas quando isso interfere no seu convívio social e vira algo recorrente, que te deixa desmotivado e melancólico, é o momento de buscar ajuda.
Com a terapia, você poderá ter um espaço para conversar, resolver questões sentimentais, analisar comportamentos e cuidar da sua saúde mental. Se cuidar, se priorizar e se respeitar é com certeza a melhor maneira que você tem para se amar.
*Doutora Linda Vieira, psicóloga do Clude – CRP 06/104660